ontem eu terminei com a minha terapeuta.
dentre as tantas coisas que encerrei esse ano, essa era a última. a ousadia de escrever isso no segundo dia de mercúrio retrógrado, ha, e ainda tem um mês inteiro que nem começou nesse ano implacável regido por exu. depois eu volto.
era um movimento, cês sabem, como tudo, que já vinha acontecendo; tinha gente que me dizia algum tempo que já sabia, com a plaquinha de torcida. talvez já soubéssemos ela e eu, também, naqueles fins de relacionamento que se faz de tudo: chalé em monte verde, cartas pra estimular conversas, abrir o casamento, se inscrever na ilha da tentação. a gente, enquanto casal sapatão, adotou uns gatos, falamos da infância, propusemos novos exercícios; todos horrorosos e igualmente doloridos e importantes. todos que resultaram no que de mais bonito poderia: o fim.
aqui vocês insiram os textos acadêmicos quaisquer da quantidade de homem branco gente que já escreveu sobre isso se quiserem, eu vou é me permitir o drama, uma vez que desatei o nó da última corda que me prendia a 2019. essa parece uma metáfora triste, de repente, mas não é nem um pouco: não me sentia presa, na verdade, mas vai ficar aí, como uma homenagem póstuma aos atos falhos. ai, o drama! eu gostava dessa corda, me orgulhava dela um tanto: cuidei com óleo e carinho, tirei do sol, chequei se não esticava muito. ela me dava prumo e direção.
acho que dá pra dizer que hoje — ou até ontem — era o relacionamento mais duradouro que eu tinha. tirando família, que não entra na categoria dos profundos, e uma amiga que vai receber um áudio meu chorando assim que esse texto terminar de ser escrito, certamente, a pessoa de maior constância no meu dia a dia. por isso chama acompanhamento, né? deve ser.
enfim, o salto violento de 2019 para 2024: todo esse tempo, semanalmente falando sobre mim. (olhando em retrospecto, essa mulher merecia mais dinheiro, coitada). vocês nem se animem achando que aqui vai rolar uma retrospectiva: em algum momento no meio desse ano eu decidi escolher melhor sobre o que eu escrevo aqui, nesse espaço público. matei uns quatro cadernos, duas canetas pretas, comprei uma impressorazinha térmica para colar os posts de instagram no papel. mesmo. apesar de perder parte significativa dos meu público que está só interessada em fofoca e piada autodepreciativa, me pareceu um bom exercício de 1) escrita, mesmo; 2) sobrevivência. esse texto veio de brinde, se lambuzem — mas não muito.
a lista do roteiro do arquivo confidencial é só minha, podem especular. tem tudo isso e tem mais, também.
a gente se orgulha muito de falar sobre fins bonitos porque confere algo de civilidade aos momentos em que somos mais horrorosos, eu acho. já ouvi tantas vezes por aí: terminamos bem, uma conversa carinhosa, tentamos de tudo, citamos o padre gato e que vai passar, criamos memórias em super 8. às vezes o fim só tem que vir, mesmo. eu acho. bruto, seco, numa salinha de luz branca no meio da firma porque foi o que deu, e não dava pra ser mais. as coisas bonitas ficam pra depois, um texto sem revisão no horário da academia, uma boa noite de sono, e o que vem agora, daqui em diante.
consegui escrever um texto que não é uma lista, olha só.
“muitas pessoas consideram útil examinar o passado de modo crítico, especialmente a infância, para mapear a internalização de mensagens que afirmavam que elas não tinham valor, não eram boas o suficiente, eram loucas, estúpidas, monstruosas, e por aí vai. apenas entender como adquirimos esses sentimentos de inutilidade raramente nos permite mudar as coisas; em geral, é só uma etapa do processo. assim como muitas outras pessoas, considerei útil examinar padrões de pensamento e comportamento negativos aprendidos na infância, especialmente aqueles que moldaram meu senso de self e identidade. entretanto, esse processo sozinho não garantiu a autorrecuperação. não foi suficiente. compartilho isso porque é muito fácil ficar empacada na simples descrição, repetindo a própria história várias vezes, o que pode ser uma forma de se apegar ao luto ligado a esse passado ou a uma narrativa que põe a culpa nos outros.”
tudo sobre o amor, bell hooks
de alta da terapia.
brace yourselves.
das partes bonitas, eu disse em voz alta que tou pronta pra me apresentar de novo.
Que maravilhoso o seu texto, Isadora. Nesse processo de análise/terapia, os fins são tão importantes quanto os começos. Estar apta a se apresentar novamente, com outros significantes, diz muito de um processo de análise saudável.
Foi muito bom te ler! 🤍
Eu também terminei um relacionamento longo com uma terapeuta,mas senti exatamente essa necessidade/vontade de me apresentar de novo,e isso é um processo que estou curtindo fazer,me apresentar de novo em uma nova relação